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Sou de uma cidade em morte lenta há décadas, num país que também não reanima e tem cada vez mais silenciosas convulsões. A minha região tem sido desfigurada pela corrupção e ganância, aquele par inseparável! Até a própria língua é desrespeitada a nível oficial e por exigência estatal!
Sendo relativamente jovem assisti só a parte do longo processo, mas já pago por ele, como infelizmente sei que os mais novos terão um débito ainda maior por tudo isto.
A irresponsabilidade política e social dura há quase quatro décadas, primeiro acusou-se o regime autoritário, felizmente esse terminou, mas a democracia que passamos a ter possibilidade de escolher nunca tem estado à altura das exigências. Sinais do bipartidarismo que tem pautado as governações.
O país precisa mesmo de uma mudança de mentalidade, não só governativa, mas de todos, é aprender a falar menos do dia de Abril e tornarmo-nos cidadãos a sério, é termos não só direitos mas também deveres, valorizarmo-nos, ter uma participação mais activa e de alguma forma responder às carências. Não o fazemos de forma triunfal, vai de outra maneira, desde que o contributo seja dado já é um passo. A mais pequena acção de sensibilização, umas linhas, uma conversa são uma ajuda. A cidadania e participação nunca foram tão importantes como agora na época conturbada que vivemos. Se metade daquela metade que não votou pensasse assim estaríamos bem melhor! É claro que a ambição seria que a grande maioria dos recenseados fosse às urnas, mas temos que ser realistas e ter a noção de que se ocorrer uma mudança esta será gradual e levará tempo, isto com a esperança de que no futuro a coisa melhorará, mas isso só o saberemos com a passagem do tempo.
Mas o que este cidadão perto dos 30 anos procura é expressar os seus anseios e perspectivas sobre o que o rodeia. Portugal tem pela terceira vez a necessidade de recorrer a ajuda externa para se financiar desta vez de forma muito mais assustadora que as duas anteriores. O desinvestimento no sector cultural já se fazia sentir há algum tempo mas com a chegada do actual governo, a situação económica global e sobretudo a falta de visão, terminou-se com o Ministério da Cultura. Agora temos apenas um Secretário de Estado da Cultura que trabalha na directa dependência do Primeiro Ministro, estranho, não é? Não acredito que sem o órgão central de coordenação da actividade cultural consigamos manter uma política decente de gestão e programação cultural, assim como a gestão e intervenção no património. Seria um aspecto a potenciar para auxiliar o país e não um sector de desinvestimento...
Como formado precisamente na área de Património Cultural entristece-me sermos passados para trás em concursos por não termos a denominação História no curso, não interessa a competência, a qualidade geral do pessoal docente e da estrutura curricular, muitas vezes superior aos tradicionais cursos de História nas suas diversas variantes. Uma situação a rever...
Outro ponto muito negativo é aquele que eu chamo a muleta do voluntariado, geralmente estão todos à espera que os trabalhos e investigações sejam gratuitos ou por um preço simbólico. Quando vai a uma consulta médica não paga? A precariedade, nem sei se vale a pena abordar com profundidade, pois é transversal a todo o mercado de trabalho e já muito foi dito, o Estado não dá exemplo, tendo pessoas anos a fio nessa condição.
Mais uma grande maleita são as pessoas não qualificadas que ocupam postos de trabalho indevidos e aquela espécie que só quer que chegue o fim do mês, promove-se assim a incompetência e deixa-se pouco espaço a quem tem juventude, vontade e competência. Há necessidade de renovação e actualização de quadros na área cultural, é um sector estratégico onde temos possibilidade de ser referência e mostrar qualidade, temos que mudar alguns paradigmas e preconceitos. Há uma geração capaz de mostrar isso à espera de oportunidades que aconselho seriamente a não desperdiçar e apostar forte nela. Pode ser que assim as cidades que morrem lentamente há décadas sejam pontos de renovação e dinamismo, a afirmação daquilo que somos capazes de fazer.
Quinta-feira, 13 de Outubro de 2011